Como funciona a organização partidária? Um olhar para a Lei n.º 9.096/1995

Por Thiago Couto, Marcelo Sasso e Leandro Almeida 

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A organização partidária possuiu um papel nas democracias contemporâneas, sendo um elemento para o funcionamento do sistema político atual. Os partidos políticos são estruturas que buscam representar e articular os interesses da sociedade, fornecendo um meio para a participação cívica, a expressão de opiniões e a competição política. Seu papel é multifacetado e ambíguo, abrangendo desde a formação de políticas até a supervisão do governo.

Essas estruturas formam e implementam políticas, desenvolvendo programas e propostas, os partidos oferecem opções aos eleitores, permitindo-lhes tomar decisões. Uma vez eleitos, os membros do partido buscam traduzir essas plataformas em ações governamentais, contribuindo para a estabilidade e a continuidade das políticas.

A organização partidária também desempenha um papel crucial na supervisão do governo. A oposição monitora as ações do poder, questionando e fiscalizando para garantir a prestação de contas. Isso contribui para a transparência e a responsabilidade, elementos essenciais para o bom funcionamento de uma democracia. Além disso, proporcionam estabilidade ao sistema político, agindo como intermediários entre os cidadãos e o governo, evitando a fragmentação e promovendo a cooperação.

Entretanto, é importante reconhecer que as organizações partidárias também enfrentam desafios. A polarização excessiva, a corrupção e a falta de representatividade podem minar a eficácia dos partidos políticos. Portanto, a promoção da participação cívica e a garantia de mecanismos internos de responsabilização são essenciais para fortalecer o papel positivo dos partidos nas democracias contemporâneas. 

Essa estrutura é gerida atualmente pela Lei n. 9.096/1995, que regula as normas relativas à organização e funcionamento dos partidos políticos, não é considerada uma lei orgânica, diferentemente de sua antecessora, a Lei n. 5.682, de 1971.

Isso se deve ao fato de que uma lei orgânica possui maior rigidez e estabelece critérios de organização e funcionamento que devem ser obrigatoriamente seguidos pelos partidos políticos. A Lei n. 9.096/1995, por outro lado, confere autonomia e liberdade aos partidos, respeitando as disposições da Lei.

Os partidos políticos são considerados pessoas jurídicas de direito privado, e isso reflete a ênfase na liberdade de atuação das agremiações. A lei permite a criação, fusão, incorporação e extinção de partidos políticos, dando autonomia para definir sua estrutura interna e funcionamento.

Art. 1º O partido político, pessoa jurídica de direito privado, destina-se a assegurar, no interesse do regime democrático, a autenticidade do sistema representativo e a defender os direitos fundamentais definidos na Constituição Federal.

Parágrafo único. O partido político não se equipara às entidades paraestatais.  

Art. 2º É livre a criação, fusão, incorporação e extinção de partidos políticos cujos programas respeitem a soberania nacional, o regime democrático, o pluripartidarismo e os direitos fundamentais da pessoa humana.

Art. 3º É assegurada, ao partido político, autonomia para definir sua estrutura interna, organização e funcionamento.

Art. 4º Os filiados de um partido político têm iguais direitos e deveres.

Art. 5º A ação do partido tem caráter nacional e é exercida de acordo com seu estatuto e programa, sem subordinação a entidades ou governos estrangeiros.

É importante ressaltar que os partidos políticos, embora sejam pessoas jurídicas de direito privado, desempenham funções tipicamente públicas. Mas não se equiparam a entidades paraestatais. Ainda, é vedado aos partidos políticos ministrar instrução militar ou paramilitar, ou utilizar organizações desse tipo e adotar uniforme para seus membros.

Art. 6º É vedado ao partido político ministrar instrução militar ou paramilitar, utilizar-se de organização da mesma natureza e adotar uniforme para seus membros.

Para que um partido político seja registrado no Tribunal Superior Eleitoral (TSE), ele deve comprovar seu caráter nacional nos termos da lei. Isso significa que, no período de 02 (dois) anos, o partido deve obter o apoio mínimo de 0,5% dos votos válidos dados na última eleição para a Câmara dos Deputados, distribuídos por pelo menos um terço dos Estados, com um mínimo de 0,1% do eleitorado que votou em cada um deles.

As três regras para a comprovação do caráter nacional devem ser satisfeitas no período de 02 (dois) anos. Uma vez registrado no TSE, o partido político obtém uma série de direitos, como a participação no processo eleitoral, o recebimento de recursos do Fundo Partidário e o acesso gratuito à rádio e a televisão. Além disso, o registro garante a exclusividade da denominação, sigla e símbolos do partido, proibindo o uso por outros partidos para evitar confusões.

Art. 7º O partido político, após adquirir personalidade jurídica na forma da lei civil, registra seu estatuto no Tribunal Superior Eleitoral.

§ 1o  Só é admitido o registro do estatuto de partido político que tenha caráter nacional, considerando-se como tal aquele que comprove, no período de dois anos, o apoiamento de eleitores não filiados a partido político, correspondente a, pelo menos, 0,5% (cinco décimos por cento) dos votos dados na última eleição geral para a Câmara dos Deputados, não computados os votos em branco e os nulos, distribuídos por um terço, ou mais, dos Estados, com um mínimo de 0,1% (um décimo por cento) do eleitorado que haja votado em cada um deles.                   

§ 2º Só o partido que tenha registrado seu estatuto no Tribunal Superior Eleitoral pode participar do processo eleitoral, receber recursos do Fundo Partidário e ter acesso gratuito ao rádio e à televisão, nos termos fixados nesta Lei.

§ 3º Somente o registro do estatuto do partido no Tribunal Superior Eleitoral assegura a exclusividade da sua denominação, sigla e símbolos, vedada a utilização, por outros partidos, de variações que venham a induzir a erro ou confusão.

Uma inovação significativa no âmbito das agremiações partidárias é a introdução das federações partidárias. Essas federações consistem na união de dois ou mais partidos políticos registrados de forma independente, atuando de maneira conjunta como uma única entidade por um período determinado. Ao contrário de fusões, na federação partidária, os partidos mantêm sua personalidade jurídica individual, unindo-se temporariamente para fortalecer sua atuação.

Art. 11-A. Dois ou mais partidos políticos poderão reunir-se em federação, a qual, após sua constituição e respectivo registro perante o Tribunal Superior Eleitoral, atuará como se fosse uma única agremiação partidária. 

O processo de criação de uma federação partidária está sujeito a diversas regras, incluindo a necessidade de que os partidos envolvidos possuam registro definitivo no Tribunal Superior Eleitoral, mantenham filiação por no mínimo quatro anos e observem prazos específicos. A abrangência nacional da federação é formalizada através do registro no Tribunal Superior Eleitoral.

É importante destacar que o pedido de registro de federação de partidos deve ser encaminhado exclusivamente ao Tribunal Superior Eleitoral, não aos Tribunais Regionais Eleitorais. Documentos como a resolução dos órgãos de deliberação nacional, o programa e estatuto comuns e a ata de eleição do órgão de direção nacional devem acompanhar o pedido.

Já o direito de filiação é garantido a todos os cidadãos, contudo, alguns requisitos devem ser atendidos, de acordo com a Lei, para exercer a capacidade eleitoral passiva. É necessário estar em gozo dos direitos políticos e seguir as regras estatutárias do partido escolhido. Após deferimento da filiação, é entregue ao filiado um comprovante adotado pela agremiação.

A Justiça Eleitoral, por meio dos órgãos partidários, registra eletronicamente os dados dos filiados, incluindo a data de filiação, número dos títulos eleitorais e número das seções de inscrição. Mudanças de partido por parte de filiados eleitos são tratadas de maneira específica, com intimação pessoal à agremiação partidária e observação dos prazos para ajuizamento de ações.

Além do desligamento voluntário, a norma prevê situações de cancelamento imediato da filiação, como morte, perda dos direitos políticos, expulsão, entre outras. A perda do mandato é aplicada ao detentor de cargo eletivo que se desfilia sem justa causa, considerando-se casos como mudança substancial do programa partidário, grave discriminação política ou desfiliação durante o período pré-eleitoral.

Outro tema relacionado e polêmico é a fidelidade partidária, com regras definidas pelos estatutos dos partidos. O entendimento consolidado é de que os cargos eleitos pelo sistema proporcional pertencem aos partidos, e não aos candidatos individualmente. Já para os eleitos pelo sistema majoritário, a desfiliação não implica perda do mandato, segundo decisão do STF.

Para apoiar financeiramente os partidos políticos, existe o Fundo Partidário, constituído por receitas diversas. A distribuição desses recursos ocorre de forma proporcional aos votos obtidos na última eleição geral para a Câmara dos Deputados, desconsiderando mudanças de filiação dos candidatos eleitos. Os partidos devem destinar os recursos para diversas finalidades, como manutenção de sedes, propaganda política, programas de promoção da participação feminina, entre outros, com regras específicas para utilização e prestação de contas.

Art. 38. O Fundo Especial de Assistência Financeira aos Partidos Políticos (Fundo Partidário) é constituído por:

I – multas e penalidades pecuniárias aplicadas nos termos do Código Eleitoral e leis conexas;

II – recursos financeiros que lhe forem destinados por lei, em caráter permanente ou eventual;

III – doações de pessoa física ou jurídica, efetuadas por intermédio de depósitos bancários diretamente na conta do Fundo Partidário;

IV – dotações orçamentárias da União em valor nunca inferior, cada ano, ao número de eleitores inscritos em 31 de dezembro do ano anterior ao da proposta orçamentária, multiplicados por trinta e cinco centavos de real, em valores de agosto de 1995.

É importante ressaltar que, após uma decisão do STF, não são mais permitidas doações de pessoas jurídicas aos partidos políticos (ADI 4650-DF), e os recursos do Fundo Partidário não estão sujeitos às disposições da Lei de Licitações. Essas medidas visam garantir a autonomia financeira dos partidos políticos.

Dada a importância da jurisprudência e dos entendimentos dos tribunais, destacamos as súmulas do TSE acerca da temática, possuindo grande valoração sobre o entendimento da legislação.

Súmula TSE n. 11: No processo de registro de candidatos, o partido que não o impugnou não tem legitimidade para recorrer da sentença que o deferiu, salvo se se cuidar de matéria constitucional.

Súmula TSE n. 20: A prova de filiação partidária daquele cujo nome não constou da lista de filiados de que trata o art. 19 da Lei n. 9.096/1995 pode ser realizada por outros elementos de convicção, salvo quando se tratar de documentos produzidos unilateralmente, destituídos de fé pública.

Súmula TSE n. 32: É inadmissível recurso especial eleitoral por violação à legislação municipal ou estadual, ao Regimento Interno dos Tribunais Eleitorais ou às normas partidárias.

Súmula TSE n. 52: Em registro de candidatura, não cabe examinar o acerto ou desa-

certo da decisão que examinou, em processo específico, a filiação partidária do eleitor.

Súmula TSE n. 53: O filiado a partido político, ainda que não seja candidato, possui legitimidade e interesse para impugnar pedido de registro de coligação partidária da qual é integrante, em razão de eventuais irregularidades havidas em convenção.

Súmula TSE n. 67: A perda do mandato em razão da desfiliação partidária não se aplica aos candidatos eleitos pelo sistema majoritário.

Em resumo, a Lei 9.096/1995 desempenha um papel fundamental na organização e no funcionamento dos partidos políticos no Brasil, contribuindo para a manutenção da democracia, a transparência no sistema político e a participação ativa dos cidadãos nas eleições e na vida política do país. Ela é essencial para garantir a legalidade e a ordem no contexto político brasileiro.

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