Por Thiago Couto, Marcelo Sasso e Leandro Almeida
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O direito de propriedade no Brasil é regido por um conjunto de normas e princípios que conferem ao proprietário uma série de poderes e prerrogativas sobre o seu bem. Esses poderes são essenciais para garantir a proteção e o uso efetivo da propriedade, contribuindo para o desenvolvimento econômico e social do país. Conforme art. 1.228 do Código Civil:
Art. 1.228. O proprietário tem a faculdade de usar, gozar e dispor da coisa, e o direito de reavê-la do poder de quem quer que injustamente a possua ou detenha.
Então do dispositivo civilista temos que a propriedade constitui os direitos de usar, fruir ou gozar, dispor e reivindicar, vejamos cada um desses elementos:
- Direito de uso: O proprietário tem o direito de usar o seu bem de acordo com a sua vontade, desde que respeite as normas legais e não infrinja os direitos de terceiros. Isso inclui o uso residencial, comercial, industrial, agrícola, entre outros.
- Direito de fruir ou de gozo: Além do uso, o proprietário tem o direito de fruir os frutos e utilidades do seu bem. Isso significa que ele pode usufruir dos rendimentos que o bem proporciona, como aluguéis, juros, dividendos, entre outros.
- Direito de disposição: O proprietário tem o direito de dispor do seu bem da forma que desejar, seja vendendo, doando, alugando, hipotecando ou cedendo de qualquer outra maneira. No entanto, é importante respeitar as limitações legais e contratuais.
- Direito de reivindicação: O proprietário tem o direito de reivindicar o seu bem caso ele seja injustamente subtraído ou ocupado por terceiros. Esse direito é garantido pelo princípio da proteção da posse e da propriedade.
É importante ressaltar que esses poderes estão sujeitos a limitações e condicionantes previstas em lei, como por exemplo, o direito de propriedade não pode ser exercido de forma abusiva, prejudicando o interesse coletivo ou os direitos fundamentais de outras pessoas.
Desta forma, a servidão de passagem pode ser entendida como uma forma de disposição do bem imóvel. É um instituto jurídico presente no direito brasileiro que permite o uso do imóvel de um terceiro para acessar outro imóvel, seja para fins de passagem, trânsito ou circulação de pessoas, animais ou veículos. Ela está regulamentada no Código Civil brasileiro, em seus artigos 1.378 a 1.389, e pode ser instituída por contrato entre as partes ou por determinação legal.
Art. 1.378. A servidão proporciona utilidade para o prédio dominante, e grava o prédio serviente, que pertence a diverso dono, e constitui-se mediante declaração expressa dos proprietários, ou por testamento, e subseqüente registro no Cartório de Registro de Imóveis.
No Brasil, a servidão de passagem pode ser estabelecida de diversas formas, sendo as mais comuns a servidão de passagem aparente e a não aparente. A servidão aparente é aquela que se manifesta de forma visível, como uma estrada ou caminho já existente, enquanto a servidão não aparente não é perceptível à primeira vista, sendo necessário recorrer à matrícula do imóvel ou a documentos cartoriais para identificá-la.
Para que a servidão de passagem seja válida, é necessário que haja uma real necessidade de acesso ao imóvel de destino, ou seja, o proprietário do imóvel que será utilizado como passagem não pode ser prejudicado de forma injusta. Além disso, é imprescindível que haja um consentimento expresso do proprietário do imóvel dominante, ou seja, aquele que irá se beneficiar com o acesso.
Caso não haja acordo entre as partes, é possível recorrer ao Poder Judiciário para a instituição da servidão de passagem. Nesse caso, será realizada uma análise criteriosa da real necessidade de acesso, bem como da possibilidade de compensação financeira ao proprietário do imóvel serviente, ou seja, aquele que cederá o acesso.
É importante ressaltar que a servidão de passagem não confere ao seu beneficiário o direito de realizar obras ou modificações no imóvel serviente sem o consentimento do proprietário. Além disso, a servidão pode ser extinta por meio da renúncia do beneficiário, da fusão dos imóveis ou pela desapropriação do imóvel serviente.
Art. 1.387. Salvo nas desapropriações, a servidão, uma vez registrada, só se extingue, com respeito a terceiros, quando cancelada.
Parágrafo único. Se o prédio dominante estiver hipotecado, e a servidão se mencionar no título hipotecário, será também preciso, para a cancelar, o consentimento do credor.
Art. 1.388. O dono do prédio serviente tem direito, pelos meios judiciais, ao cancelamento do registro, embora o dono do prédio dominante lho impugne:
I – quando o titular houver renunciado a sua servidão;
II – quando tiver cessado, para o prédio dominante, a utilidade ou a comodidade, que determinou a constituição da servidão;
III – quando o dono do prédio serviente resgatar a servidão.
Art. 1.389. Também se extingue a servidão, ficando ao dono do prédio serviente a faculdade de fazê-la cancelar, mediante a prova da extinção:
I – pela reunião dos dois prédios no domínio da mesma pessoa;
II – pela supressão das respectivas obras por efeito de contrato, ou de outro título expresso;
III – pelo não uso, durante dez anos contínuos.
No âmbito do direito brasileiro, a servidão visa conciliar os interesses dos proprietários dos imóveis envolvidos, garantindo o acesso necessário sem causar prejuízos injustificados. Assim, sua regulamentação busca promover a segurança jurídica e a harmonia nas relações de vizinhança.
Para melhor segurança jurídica o seu registro deve ocorrer no cartório de registro de imóveis (CRI) no qual a matrícula consta. Em geral são por meio dos seguintes documentos: Escritura Pública; Decisão Judicial; Se parte do imóvel for gravada de servidão de passagem apresentar: a) Planta; b) Memorial; c) ART com o comprovante de pagamento; d) Se o transmitente for pessoa jurídica tem que ser mencionado as CND’s de tributos federais e do INSS; e) Se firma individual apresentar documentos de pessoa física; f) Apresentar recolhimento de ITBI/ITCMD ou Guia do ITBI isenta. Conforme arts. 1.225 e 1.227 do Código Civil
Art. 1.225. São direitos reais:
…
III – as servidões;
…
Art. 1.227. Os direitos reais sobre imóveis constituídos, ou transmitidos por atos entre vivos, só se adquirem com o registro no Cartório de Registro de Imóveis dos referidos títulos (arts. 1.245 a 1.247), salvo os casos expressos neste Código.
A partir da entrada deste protocolo junto ao CRI, será realizado o procedimento interno em que serão analisadas as documentações e eventuais pendências. Cabe o registro da prudência em verificar no CRI do imóvel serviente o trâmite e documentos necessários.
Outra situação que envolve o uso de imóvel de terceiros é a passagem de cabos e tubulações. Para entendermos melhor a questão, é importante destacar que está diretamente relacionada à prestação de serviços públicos essenciais, como energia elétrica, água, esgoto, telefonia, internet, gás, entre outros. Esses serviços demandam uma infraestrutura física para sua distribuição e fornecimento, o que muitas vezes requer a instalação de cabos e tubulações em terrenos particulares. Analisemos o art. 1.286 e 1.287 do Código Civil.
Art. 1.286. Mediante recebimento de indenização que atenda, também, à desvalorização da área remanescente, o proprietário é obrigado a tolerar a passagem, através de seu imóvel, de cabos, tubulações e outros condutos subterrâneos de serviços de utilidade pública, em proveito de proprietários vizinhos, quando de outro modo for impossível ou excessivamente onerosa.
Parágrafo único. O proprietário prejudicado pode exigir que a instalação seja feita de modo menos gravoso ao prédio onerado, bem como, depois, seja removida, à sua custa, para outro local do imóvel.
Art. 1.287. Se as instalações oferecerem grave risco, será facultado ao proprietário do prédio onerado exigir a realização de obras de segurança.
Ou seja, do dispositivo legal verificamos que o proprietário de imóvel é obrigado a tolerar essa passagem que seja de serviços de utilidade pública. No entanto, o próprio dispositivo impõe obrigações, como indenização prévia ou obras de segurança. Ainda, o entendimento da lei e da jurisprudência, esta é uma passagem forçada, não se confundindo com a servidão de passagem anteriormente exposta. Conforme art. 1.285 do Código Civil:
Art. 1.285. O dono do prédio que não tiver acesso a via pública, nascente ou porto, pode, mediante pagamento de indenização cabal, constranger o vizinho a lhe dar passagem, cujo rumo será judicialmente fixado, se necessário.
§ 1 O sofrerá o constrangimento o vizinho cujo imóvel mais natural e facilmente se prestar à passagem.
§ 2 o Se ocorrer alienação parcial do prédio, de modo que uma das partes perca o acesso a via pública, nascente ou porto, o proprietário da outra deve tolerar a passagem.
§ 3 o Aplica-se o disposto no parágrafo antecedente ainda quando, antes da alienação, existia passagem através de imóvel vizinho, não estando o proprietário deste constrangido, depois, a dar uma outra.
A passagem forçada possui natureza jurídica de vizinhança e decorre da própria lei. É uma obrigação legal imposta, aplicando-se apenas a prédios encravados, quando necessário para a saída útil do prédio encravado para via pública através do prédio serviente. O enunciado 88 do Conselho de Justiça Federal (CJF) estabelece que o direito de passagem forçada também é garantido nos casos em que o acesso à via pública for insuficiente ou inadequado, considerando as necessidades de exploração econômica. Assim entende o STJ:
Civil. Direitos de vizinhança. Passagem forçada (CC/1916, art. 559). Imóvel encravado. Numa era em que a técnica da engenharia dominou a natureza, a noção de imóvel encravado já não existe em termos absolutos e deve ser inspirada pela motivação do instituto da passagem forçada , que deita raízes na supremacia do interesse público; juridicamente encravado é o imóvel cujo acesso por meios terrestres exige do respectivo proprietário despesas excessivas para que cumpra a função social sem inutilizar o terreno do vizinho, que em qualquer caso será indenizado pela só limitação do domínio.
A constituição desse direito pode ocorrer por meio de convenção entre as partes ou por determinação judicial. Se realizado por acordo, este deve ser expresso e seguir as formalidades legais. Pode-se firmar um instrumento particular entre o prédio dominante e o prédio serviente, permitindo o acesso à propriedade privada do serviente para alcançar a via pública.
Em caso de resistência por parte do proprietário do prédio serviente, a questão pode ser resolvida através de ação judicial, por meio da Ação de Passagem Forçada. Os legitimados ativos para requerer a passagem são o proprietário, usufrutuário, habitador ou possuidor, enquanto o polo passivo da ação é ocupado apenas pelo proprietário do prédio serviente.
Este instituto possui caráter obrigacional propter rem, ou seja, acompanha o imóvel, e o direito de requerer a passagem forçada é imprescritível, podendo ser reclamado a qualquer tempo, desde que exista o encravamento. No entanto, caso essa limitação deixe de existir, o direito de passagem também deixa de assistir ao proprietário do prédio dominante.
Desta feita, entendemos que as partes podem convencionar uma servidão de passagem nessa situação, realizando o registro da mesma forma informada anteriormente para a servidão. Visando uma maior segurança jurídica e evitando futuras demandas, busque informações legais acerca do caso concreto.
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