Restituição de valores atrasados em imóveis adquiridos em leilão

Por Thiago Couto, Marcelo Sasso e Leandro Almeida 

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Adquirir um imóvel por meio de financiamento é uma prática comum, especialmente para quem deseja realizar o sonho da casa própria. Esse processo envolve a obtenção de recursos financeiros junto a uma instituição bancária ou empresa financiadora, permitindo que o comprador pague o valor do imóvel de forma parcelada ao longo de um período pré-estabelecido.

Os termos e condições do financiamento podem variar conforme a instituição financeira escolhida, o perfil do comprador e as condições do mercado imobiliário. As taxas de juros são um fator crucial, pois afetam diretamente o custo final do imóvel. O prazo para quitação do financiamento também é relevante, pois determina o tempo em que o comprador comprometerá parte de sua renda para pagamento das parcelas.

É comum que o imóvel adquirido por financiamento seja utilizado como garantia do próprio empréstimo. Isso significa que, em caso de inadimplência, o comprador pode perder a propriedade. Portanto, é essencial que o comprador esteja ciente de sua situação financeira, avalie cuidadosamente as cláusulas do contrato e esteja preparado para cumprir o compromisso de pagamento das prestações mensais.

Se os pagamentos não forem feitos conforme o acordado, o comprador entra em situação de inadimplência, podendo levar à perda do imóvel. As instituições financeiras, então, recorrem a medidas legais para recuperar os valores devidos.

Nessa situação, o imóvel pode ser levado a leilão como parte do processo de recuperação de crédito. O leilão é uma venda pública onde o imóvel é oferecido a potenciais compradores interessados. O valor obtido no leilão geralmente é usado para quitar parte ou a totalidade da dívida pendente.

Esse procedimento é regulado pela Lei Federal n.º 9.514, de 20 de novembro de 1997, que instituiu o Sistema de Financiamento Imobiliário (SFI) e a alienação fiduciária de coisa imóvel, também conhecida como Lei do Sistema de Financiamento Imobiliário.

A lei estabelece um conjunto de normas e procedimentos que visam estimular o mercado de crédito imobiliário no país. O SFI é composto por instituições financeiras que oferecem empréstimos para a compra, construção ou reforma de imóveis, contribuindo significativamente para a melhoria do mercado de crédito imobiliário no Brasil e para a realização do sonho da casa própria de milhões de brasileiros.

Em seus artigos 22 e seguintes, a lei define a alienação fiduciária como o negócio jurídico pelo qual o fiduciante, com o objetivo de garantir uma obrigação própria ou de terceiro, transfere ao credor, ou fiduciário, a propriedade resolúvel de coisa imóvel. Vejamos na íntegra:

Art. 22. A alienação fiduciária regulada por esta Lei é o negócio jurídico pelo qual o fiduciante, com o escopo de garantia de obrigação própria ou de terceiro, contrata a transferência ao credor, ou fiduciário, da propriedade resolúvel de coisa imóvel.

§ 1o  A alienação fiduciária poderá ser contratada por pessoa física ou jurídica, não sendo privativa das entidades que operam no SFI, podendo ter como objeto, além da propriedade plena: 

I – bens enfitêuticos, hipótese em que será exigível o pagamento do laudêmio, se houver a consolidação do domínio útil no fiduciário; 

II – o direito de uso especial para fins de moradia; 

III – o direito real de uso, desde que suscetível de alienação;       

IV – a propriedade superficiária.     

V – os direitos oriundos da imissão provisória na posse, quando concedida à União, aos Estados, ao Distrito Federal, aos Municípios ou às suas entidades delegadas, e a respectiva cessão e promessa de cessão;

VI – os bens que, não constituindo partes integrantes do imóvel, destinam-se, de modo duradouro, ao uso ou ao serviço deste. 

Nesta modalidade, ao assinar o contrato, o comprador transfere a propriedade do imóvel para o credor, que se torna o proprietário fiduciário do bem até que o comprador quite integralmente o valor do financiamento, conforme o cronograma de pagamento acordado. Em caso de inadimplência, o credor pode executar a garantia, vendendo ou adjudicando o imóvel conforme os procedimentos estabelecidos. A adjudicação do imóvel ocorre quando, após o insucesso do leilão, o credor pode ficar com o bem.

Portanto, nos casos em que o bem é leiloado por um valor superior ao débito, pode haver restituição ao devedor fiduciante de um eventual saldo credor, calculado com base na diferença entre o valor da dívida, acrescido dos encargos especificados nos §§ 2º-B e 3º, do art. 27, da Lei nº 9.514/97, e o valor da adjudicação (imóvel incorporado ao patrimônio do credor pela avaliação) e o valor do débito atualizado. Vejamos os institutos mencionados:

Art. 27. Consolidada a propriedade em seu nome, o fiduciário promoverá leilão público para a alienação do imóvel, no prazo de 60 (sessenta) dias, contado da data do registro de que trata o § 7º do art. 26 desta Lei.

§ 2º-B Após a averbação da consolidação da propriedade fiduciária no patrimônio do credor fiduciário e até a data da realização do segundo leilão, é assegurado ao fiduciante o direito de preferência para adquirir o imóvel por preço correspondente ao valor da dívida, somado às despesas, aos prêmios de seguro, aos encargos legais, às contribuições condominiais, aos tributos, inclusive os valores correspondentes ao imposto sobre transmissão inter vivos e ao laudêmio, se for o caso, pagos para efeito de consolidação da propriedade fiduciária no patrimônio do credor fiduciário, e às despesas inerentes aos procedimentos de cobrança e leilão, hipótese em que incumbirá também ao fiduciante o pagamento dos encargos tributários e das despesas exigíveis para a nova aquisição do imóvel, inclusive das custas e dos emolumentos. 

§ 3º Para os fins do disposto neste artigo, entende-se por:

I – dívida: o saldo devedor da operação de alienação fiduciária, na data do leilão, nele incluídos os juros convencionais, as penalidades e os demais encargos contratuais;

II – despesas: a soma das importâncias correspondentes aos encargos e às custas de intimação e daquelas necessárias à realização do leilão público, compreendidas as relativas aos anúncios e à comissão do leiloeiro; e

III – encargos do imóvel: os prêmios de seguro e os encargos legais, inclusive tributos e contribuições condominiais.

É expressamente vedado o enriquecimento sem causa, pois este é um princípio geral de direito de extrema importância que deve ser observado obrigatoriamente. Portanto, o credor não pode aumentar seu patrimônio sem uma causa justificada.

O devedor deve receber a diferença entre o valor da avaliação e o valor da dívida, atualizados e acrescidos dos encargos descritos nos §§ 2º-B e 3º do art. 27 da Lei nº 9.514/97. O montante exato deverá ser calculado aritmeticamente na liquidação de sentença, na fase adequada, seguindo os parâmetros mencionados.

Analisar o caso concreto e examinar detalhadamente os contratos é uma etapa crucial na recuperação de valores, especialmente em situações que envolvem a venda de imóveis em leilão. Essa prática é fundamental, pois cada situação tem peculiaridades que podem influenciar diretamente os direitos do devedor e as possibilidades de recuperação de valores.

A verificação criteriosa do caso permite avaliar as circunstâncias específicas. Esse exame detalhado contribui para uma análise contextualizada, alinhada com as particularidades do contrato e dos valores envolvidos. Assim, a importância de analisar o caso concreto e os contratos reside na necessidade de garantir uma abordagem personalizada e juridicamente embasada diante de situações complexas. Essa prática protege os direitos do devedor e maximiza as possibilidades de recuperação de valores.

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