Há validade jurídica nas contratações firmadas via Whatsapp?

Por Thiago Couto, Marcelo Sasso e Leandro Almeida 

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No cenário contemporâneo, marcado pela constante evolução tecnológica e pela disseminação das comunicações instantâneas, o WhatsApp desponta como uma ferramenta ubíqua, estabelecendo-se como um dos principais meios de comunicação utilizados em diversos âmbitos da sociedade. Nesse contexto, surgem questionamentos acerca da validade jurídica dos contratos firmados por meio dessa plataforma. 

O WhatsApp, aplicativo de mensagens instantâneas lançado em 2009 e adquirido pelo Facebook em 2014, conquistou uma vasta base de usuários ao redor do mundo, sendo amplamente utilizado tanto para comunicações pessoais quanto profissionais. A praticidade e a rapidez proporcionadas por essa ferramenta tornaram-na uma escolha frequente para a troca de informações, inclusive no âmbito empresarial.

Com o aumento da utilização do WhatsApp para a realização de negócios e transações comerciais, surge a necessidade de compreender como o direito trata os contratos firmados por meio dessa plataforma. Questões relacionadas à formação, validade e prova desses contratos suscitam debates entre juristas, uma vez que o arcabouço legal muitas vezes não acompanha o ritmo das transformações tecnológicas.

Para compreender a validade jurídica dos contratos firmados via WhatsApp, é fundamental analisar os elementos essenciais à formação de um contrato. Segundo o Código Civil brasileiro, são requisitos básicos para a validade de um contrato: capacidade das partes, objeto lícito, possível, determinado ou determinável, e forma prescrita ou não defesa em lei.

No que tange à capacidade das partes, o WhatsApp não impõe restrições quanto à idade ou capacidade civil dos usuários, possibilitando que qualquer pessoa que detenha um smartphone e uma conexão à internet utilize a plataforma para realizar negócios. Dessa forma, desde que as partes sejam capazes, o requisito da capacidade é atendido.

Quanto ao objeto do contrato, é necessário que este seja lícito, possível, determinado ou determinável. O objeto do contrato firmado via WhatsApp deve ser passível de realização e não pode ser contrário à lei, à ordem pública ou aos bons costumes. Além disso, é essencial que seja determinado ou, ao menos, determinável, possibilitando a identificação clara do que está sendo objeto do acordo.

A respeito da forma do contrato, a legislação brasileira adota o princípio da liberdade das formas, ou seja, os contratos podem ser celebrados de maneira verbal, escrita ou por outros meios convencionados pelas partes. Nesse sentido, não há exigência de uma forma específica para a validade do contrato, a menos que a lei assim o determine.

Nesse contexto, o artigo 107 do Código Civil estabelece que a validade da declaração de vontade não está condicionada a uma forma específica, exceto quando expressamente exigida por lei. Essa disposição, em conjunto com o artigo 425 do mesmo diploma legal, que permite às partes estabelecer contratos atípicos desde que observadas as normas gerais estabelecidas no Código, reafirma o princípio da liberdade contratual. No entanto, é importante ressaltar que essa liberdade deve ser exercida dentro dos limites da função social do contrato, conforme estabelecido no artigo 421 do Código Civil.

No entanto, um dos pontos mais controversos relacionados aos contratos firmados via WhatsApp diz respeito à prova desses acordos. No ordenamento jurídico brasileiro, a prova dos contratos pode ser feita por diversos meios, tais como documentos escritos, testemunhas, gravações audiovisuais, entre outros.

No contexto do WhatsApp, a principal forma de prova costuma ser a troca de mensagens entre as partes. Por meio dos registros das conversas, é possível demonstrar o consentimento das partes, as condições acordadas e outros elementos relevantes para a configuração do contrato. Contudo, é importante ressaltar que, para que as mensagens de WhatsApp tenham validade como prova, é necessário que não tenham sido adulteradas ou manipuladas.

A fim de garantir a autenticidade das mensagens trocadas via WhatsApp, algumas medidas podem ser adotadas, tais como a utilização da função de criptografia de ponta a ponta, que visa proteger o conteúdo das mensagens contra acessos não autorizados, e a realização de capturas de tela para registrar o teor das conversas no momento em que estas ocorrerem.

Apesar da crescente utilização do WhatsApp para a celebração de contratos, alguns desafios e implicações jurídicas surgem nesse contexto. Um dos principais desafios consiste na garantia da segurança e integridade das comunicações realizadas por meio da plataforma, considerando-se a possibilidade de interceptações, invasões de privacidade e manipulações de mensagens.

Outro ponto relevante diz respeito à interpretação das cláusulas contratuais, especialmente quando estas são estabelecidas de forma informal e sem a devida reflexão das partes. A linguagem utilizada nas conversas de WhatsApp tende a ser mais informal e sucinta, o que pode gerar ambiguidades ou lacunas interpretativas no momento de aplicar e executar o contrato.

Entretanto, é crucial notar que, embora um contrato celebrado via WhatsApp seja considerado válido, ele serve apenas como um instrumento de prova a ser utilizado em caso de inadimplemento, em uma potencial ação judicial que discuta a existência da relação contratual e suas consequências decorrentes do não cumprimento, conforme estabelece o artigo 369 do Código de Processo Civil (CPC). Este artigo garante às partes o direito de utilizar todos os meios legais e moralmente legítimos para provar a veracidade dos fatos alegados e influenciar eficazmente na convicção do juiz.

Portanto, é importante ressaltar que um contrato celebrado via WhatsApp não desfruta da certeza e exigibilidade de um título executivo extrajudicial, uma vez que não está incluído na lista dos títulos executivos extrajudiciais previstos no artigo 784 do CPC.

Em termos práticos, é essencial esclarecer que a existência de um título executivo extrajudicial pressupõe que a obrigação contraída pelo devedor seja certa, líquida e exigível, dispensando assim a proposição de uma ação de cognição ampla para discutir a existência do débito e o eventual inadimplemento.

No entanto, surge um problema quando há contestação quanto à autenticidade da prova, especialmente quando essa prova consiste em capturas de tela. Ao fazer uma captura de tela, obtém-se uma imagem estática que, inicialmente, é difícil de verificar quanto à sua autenticidade, uma vez que não é possível identificar a origem das mensagens de forma inequívoca (ausência de rastreabilidade).

O CPC de 2015 aborda essa questão ao estipular no artigo 422, §1º, que “as fotografias digitais e as extraídas da rede mundial de computadores fazem prova das imagens que reproduzem, devendo, se impugnadas, ser apresentada a respectiva autenticação eletrônica ou, não sendo possível, realizada perícia.”

Portanto, é evidente a dificuldade de comprovar e garantir a autenticidade, integridade e validade jurídica de uma captura de tela desvinculada do meio físico onde foi produzida, uma vez que a perícia não seria realizada nas fotografias apresentadas, mas sim no dispositivo eletrônico que as gerou.

Assim, uma solução alternativa seria apresentar as cópias das mensagens juntamente com o dispositivo eletrônico que as produziu perante o escrivão judicial, que, após verificar a autenticidade e integridade, atribuiria fé pública às imagens, conforme previsto no artigo 424 do CPC. Outra opção seria a produção prévia de uma ata notarial, lavrada por um tabelião competente, conforme estabelece o artigo 384 do CPC.

Nesse caminho a ata notarial pode ser um caminho para comprovação e validade da contratação realizada via WhatsApp. A prova constituída pela ata notarial é uma ferramenta essencial no universo jurídico, fornecendo um meio confiável de documentar fatos e eventos de maneira imparcial e autêntica. 

A ata notarial é um documento produzido por um tabelião ou notário público, que atesta a veracidade e autenticidade de fatos presenciados ou declarados diante dele. Esse instrumento é frequentemente utilizado para registrar eventos, declarações, condições físicas de objetos ou propriedades, entre outros aspectos relevantes. 

As atas notariais têm uma variedade de propósitos e aplicações. Em muitos casos, são utilizadas para registrar contratos, transações imobiliárias, declarações de testemunhas, estado de bens, entre outros. Sua principal função é garantir que os fatos registrados sejam verdadeiros e autênticos, fornecendo assim segurança jurídica às partes envolvidas. 

A produção de uma ata notarial segue um processo formal e regulamentado. Inicialmente, a pessoa interessada em obter a ata agenda uma visita ao tabelionato ou cartório notarial. No momento agendado, ela comparece ao local junto com as testemunhas, se necessário, e apresenta os documentos ou fatos a serem atestados.

O tabelião ou notário, então, analisa as informações fornecidas e, se considerar necessário, realiza diligências adicionais para verificar a veracidade dos fatos. Uma vez confirmada a veracidade das informações, o tabelião redige o texto da ata, descrevendo detalhadamente os eventos, declarações ou condições físicas observadas.

Podendo ser apresentado o celular com a conversa e contratação, podendo ser assim reduzida a um termo que goza dos melhores atributos de prova. Após a redação do texto, as partes envolvidas na ata ou seus representantes legais a revisam e, se estiverem de acordo, assinam o documento juntamente com as testemunhas, se houver. O tabelião então faz o registro da ata em seu livro próprio e emite as cópias necessárias para as partes interessadas.

Uma das características mais importantes da ata notarial é sua validade legal. Por ser produzida por um oficial público, com fé pública, a ata notarial goza de presunção de veracidade e autenticidade. Isso significa que, em caso de litígio ou disputa judicial, o documento é considerado prova pré-constituída, ou seja, tem grande peso probatório perante os tribunais.

Apesar dessa forma de comprovação ser capaz tecnicamente, a jurisprudência ainda está em processo de desenvolvimento no que se refere aos contratos firmados via WhatsApp, o que pode gerar insegurança jurídica para as partes envolvidas. A falta de precedentes consolidados e a diversidade de entendimentos entre os tribunais podem dificultar a previsibilidade dos resultados em casos litigiosos.

A utilização do WhatsApp para a celebração de contratos representa uma realidade cada vez mais presente na sociedade contemporânea. A praticidade e a agilidade oferecidas por essa plataforma tornam-na uma escolha natural para a comunicação entre as partes, especialmente em transações comerciais de menor complexidade.

No entanto, é fundamental que as partes estejam cientes dos desafios e das implicações jurídicas envolvidas na utilização do WhatsApp para a formalização de contratos. A segurança das comunicações, a clareza das cláusulas contratuais e a garantia da validade e da autenticidade das mensagens trocadas são aspectos que devem ser considerados para mitigar possíveis conflitos e assegurar a eficácia dos acordos firmados.

Por fim, cabe aos operadores do direito e às autoridades competentes acompanhar de perto as transformações tecnológicas e interpretar o arcabouço jurídico de forma a garantir que a legislação seja adequada aos desafios apresentados pela era digital, promovendo a segurança jurídica e a justiça nas relações contratuais estabelecidas via WhatsApp e outras plataforma.

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